‘Lá vou eu outra vez’ – As esperanças de Waddington finalmente serão cumpridas? Parte II

por Erik L Peterson

 

Thomas Hunt Morgan

 

 

Pergunta 2: Como os biólogos tentaram corrigir a divisão entre desenvolvimento e herança no passado?

 

Resposta 2: Morgan (1934) e Waddington (1940).

 

O livro de 1934, Embriologia e Genética, de T. H. Morgan, foi uma primeira tentativa importante de estreitar a separação entre desenvolvimento e herança. Morgan colocou a culpa da divisão no vitalismo e no trabalho de “organizador” de Hans Spemann.

 

Em 1922, a aluna de Spemann, Hilde Pröscholdt, arrancou delicadamente uma lâmina do lábio superior do blastóporo de uma espécie de tritão e transplantou-a para a parede do embrião de uma outra espécie de tritão, logo abaixo do ectoderme. O transplante induziu a formação de um tubo neural completo no organismo que recebeu o transplante.1 Spemann nomeou essa pequena região de células que foi transplantada do lábio de blastóporo como “organizador” porque poderia cooptar o tecido circundante para criar um novo tubo neural mesmo sendo de organismos não relacionados.2 Spemann insistiu que os experimentos com organizadores minariam qualquer explicação mecanicista do desenvolvimento. Os organismos eram, na sua terminologia, “sistemas equipotenciais harmoniosos”.3 Organismos são campos, em outras palavras, olhando para fora, reunindo informações do entorno para determinar seus próprios destinos.

 

Infelizmente, a expressão “sistema equipotencial harmonioso”, como Morgan bem sabia, Spemann emprestou de Driesch; era uma expressão vitalista. Em Embriologia e Genética, a solução de Morgan foi manter o trabalho experimental de Spemann sem levar em conta a explicação dele. Como alternativa, Morgan insistiu que devemos considerar todas as características, inclusive as de desenvolvimento, como sendo consequência do “colar de contas” que são os genes. Na nova versão de desenvolvimento de Morgan, os organismos não deveriam ser vistos em divisões, mas como coleções de partículas crescendo juntas dando origem a características fenotípicas. Havia pouca necessidade de entender como as partículas e o processo estavam conectados. (Caso em questão, quando acusado por Boris Ephrussi de colocar um título enganador, uma vez que quase não havia discussão sobre desenvolvimento em Embriologia e Genética, Morgan retrucou: “Não há lá um pouco de embriologia e um pouco de genética?”).

 

Depois de seu trabalho embriológico inicial no laboratório de anfíbios de Spemann no começo dos anos 1930, e seu trabalho posterior no laboratório de moscas de Morgan no final da mesma década, Waddington fez outra tentativa de integrar desenvolvimento e herança em Organizadores e Genes (1940). “Uma teoria coerente do desenvolvimento não pode ser fundada nas propriedades conhecidas dos genes”, insistiu Waddington. Todo estudo precisava começar usando as técnicas da embriologia em vez das técnicas dos geneticistas da mosca da fruta. Para entender por que os organismos se formam da maneira que eles se formam, precisamos desfazer a “rede causal direta por trás desse processo específico de diferenciação ocorrendo neste momento particular” (p. 3). Para Waddington, o desenvolvimento é o processo de certa forma imprevisível pelo qual uma “configuração instável de substâncias” move o tecido embrionário em direção a um “estado mais estável” através de múltiplos pontos de ramificação, onde um certo estímulo pode forçar o desenvolvimento nesse tecido em direção a um resultado em vez de outro (p 45). Waddington considerava o embrião como um conjunto de competências, um sistema dinâmico nebuloso e multi-determinado, não como uma máquina já instruída por seus genes para chegar a um fim definido.

 

Por causa do seu conceito de organismo como sistema integrado, Waddington enfatizou duas características do processo de desenvolvimento sugeridas pelos primeiros biólogos do desenvolvimento, mas que Morgan e outros geneticistas ignoraram. Primeiro ele identificou uma mudança rápida no processo de desenvolvimento em resposta às condições ambientais que pareciam ser hereditárias, também conhecidas como “características adquiridas”, e depois ele destacou o tamponamento do desenvolvimento contra mudanças ambientais, ou “canalização”. Ele explicou essas características em mais detalhes ao longo dos artigos escritos nas décadas de 1940 e 1950, especialmente em seu livro de 1957 A Estratégia dos Genes. Esta é a metáfora que Waddington tentou propor com sua paisagem epigenética. Mas o esquema geral já existia na década de 1930.

 

Como exatamente isso é uma “correção” para a divisão entre embriologia e genética? Bem, deve ficar claro que na formulação de Waddington os genes perdem primasia. Eles são extremamente importantes para a produção de todo o drama mas, em vez de atores, eles são a equipe de palco. Os atores no drama são inicialmente cada célula, incluindo o citoplasma, depois regiões ou campos morfogenéticos do embrião em desenvolvimento, e então tecidos, órgãos e apêndices que se movem em direção a vários destinos possíveis, dependendo dos contextos. Os genes fornecem os contornos do espaço de possibilidades fenotípicas. Mas eles não dão instruções determinantes para traços específicos. Essa parte da história está no reino da epigenética.

 

 

 

 

1. Hamburger, “Hilde Mangold,” 10.
2. Spemann and H. [Pröscholdt] Mangold, “Induction of Embryonic Primordia”; and DeRobertis, “Spemann’s Organizer.”
3. Spemann and H. [Pröscholdt] Mangold, “Induction of Embryonic Primordia,” 38.

 

 

Esta é uma minissérie em três partes:
Parte I: Como surgiu a divisão entre desenvolvimento e herança?
Parte II (este post): Como os biólogos tentaram reparar a divisão entre desenvolvimento e herança no passado?
Parte III: Por que de Waddington não tentou corrigir a divisão entre os trabalhos de desenvolvimento e de herança?

 

 

Erik Peterson
Erik L Peterson
Assistant Professor of the History of Science, The University of Alabama

 

 

Compartilhe este post no Twitter ou Facebook

 

 

Read this post in
icon linking to English translation